domingo, 29 de outubro de 2023

SUP - Sistema Único de Poesia


O Homem Com A Flor Na Boca com o livro e a caneta nas mãos - Sarau Cultural - As Multiliguagens no Palácio - Ocupação Poética - Palácio da Cultura - Campos dos Goytacazes-RJ - foto : Antônio Filho

 Lançamento em São Paulo dia 29 de novembro no Sarau Gente de Palavra Lançamento em Campos no sarau de dezembro  - aguardem informação da data

 

absinto

impossível

te sentir mais do que já sinto

 

Artur Gomes

O Homem Com A Flor Na Boca

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https://fulinaimagens.blogspot.com/


Autografando O Homem Com A Flor na Boca para Clara Abreu, hoje durante ensaio no Palácio da Cultura. Lançamento dia 29 novembro – no Sarau Gente de Palavra em São Paulo 




mesmo não fosse Bárbara essa onda jorrando sal em minha boca às 5 horas da tarde em tudo que ainda arde mesmo não fossem minhas suas palavras acesas xingando as ervas daninhas


tirar leite das pedras plantar flores no deserto talvez seja essa a minha sina lamber o sal no pó mar de amaralina sentir na pele o objeto do desejo sangrar a carne no desejo do objeto ofertar a boca para o beijo no asfalto colher a lírica na argamassa do concreto

Artur Gomes
O Homem Com A Flor Na Boca


Irina me disse: - há um poema seu debaixo das escadas atrás de cada porta dos palácios metaforicamente fulinaíma desvenda todos os mistérios interplanetários na invasão dos intra poderes que comandam a invssão cibernética dos ventos e por consequência a invasão dos corpos



 Ofício de poeta


franzir a noite.
é o mesmo que bordar o dia
costuro o tempo
com linhas de pescar
moinhos de vento
entre o franzido e o bordado
escrevo um desenredo
e vou foto.grafando
filmando poesia
na solidão
dos meus brinquedos

Artur Gomes
O Homem Com A Flor Na Boca

https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/



Baixe gratuitamente

A Caminho de Pasárgada – 2023, é uma antologia de poetas brasileiros exclusiva do portal Ornitorrincobala.
Nela, mostramos um panorama da melhor poesia contemporânea brasileira, dentro do contexto da produção digital.

 

exu cabra da peste oxente

 

hoje acordei

com uma vontade da porra

de trepar na goiabeira

talvez assim quem sabe

ela me chame de jesus

e tire ele da cruz

 

ou quem sabe bacurau

ou quem sabe bacuri

para acabar com karcamanos

 

ou então até quem sabe

ela me chame

de exu cabra da peste

do nordeste koreano

 

Artur Gomes

 https://jidduksonline.com.br/ornitorrincobala-a-caminho-de-pasargada/?fbclid=IwAR0USZGSeqKH6tUfB2gBtNGFLDycCE_EELDRiOyKjODUgyLlADBxUKw3ij4



Banho de poesia

 

Eu tomo banho de poesia

até esgotar a caixa d'água

eu tomo banho de poesia

e descortino toda fumaça

 

eu tomo banho de poesia

até faltar luz no prédio

eu tomo banho de poesia

se não tiver outro remédio

 

eu tomo banho de poesia

quando volto da ruaça

eu tomo banho de poesia

e desembaço as vidraças

 

eu tomo banho de poesia

quente ou fria, sem mistério

eu tomo banho de poesia

e raramente me seco.

 

Saullo de Oliveira

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naufrágio

vasculha entre teus pertences
uma lembrança do mar

caminha com ela a vida toda
vai e veleja

invade a mente de quem não acredita mais
nas estrelas e luas

de todo e qualquer desânimo
que se mostre sem forças

e grite
e ressoe com todo seu esplendor

que porventura o naufrágio
por onde todos nós boiamos

é nada
quando se pensa na ressurreição
dos ossos
e da manhã
com todas as suas flores
e magias.

Cgurgel

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quarta-feira, 25 de outubro de 2023

SUP - Sistema Único de Poesia


O Homem Com A Flor Na Boca com o livro e a caneta nas mãos - Sarau Cultural - As Multiliguagens no Palácio - Ocupação Poética - Palácio da Cultura - Campos dos Goytacazes-RJ - foto : Antônio Filho

 

absinto

impossível

te sentir mais do que já sinto

 

Artur Gomes

O Homem Com A Flor Na Boca

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Jura Secreta 52

injúria secreta

 

Suassuna no teu corpo

couro de cor Compadecida

Ariano sábio e louco

inaugura em mim a vida

 

Pedra do Reino no riacho

gumes de atalhos na pedreira

menina dos brincos de pérola

pétala na mola do moinho

palavra acesa na fogueira

 

pós os ismos tudo e pós

na pele ou nas aranhas

na carne ou nos lençóis

no palco ou no cinema

 

a palavra que procuro

é clara quando não é gema

até furar os meus olhos

com alguma cascata de luz

 

devassa em mim quando transcende

lamparina que acende

e transforma em mel

o que antes era pus

 

Artur Gomes

do livro Juras Secretas

Editora Penalux - 2018

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Poética, política e memória

 Escrever prefácio para um livro de Artur Gomes é um desafio prazeroso. Desafiante é mergulhar no universo imagético e político que sempre compôs sua poética. Este O Homem Com A Flor Na Boca : Deus Não Joga Dados acrescenta o substrato memorialístico ao seu repertório formando a tríade que sustenta o livro temática e formalmente. Meu primeiro contato com a poesia de Artur se deu nos anos 80 por intermédio de seu livro Suor & Cio, obra cuja temática estava em consonância com as reflexões suscitadas pelas “comemorações” do centenário da Abolição da Escravatura em 1988. A partir daí, acompanhei suas criações tanto impressas quanto performáticas, pois Artur não é poeta apenas de livros e silêncios das salas de estares, livrarias e bibliotecas, mas também dos bares, ruas e praças que são do poeta como o céu é do condor.

 Poucos poetas contemporâneos expressam tão bem as principais bandeiras do Modernismo de 22 quanto esse vate pós-moderno. Sua poesia é política, antropofágica, nonsense, musical, polifônica e sobretudo intertextual, além de dotada de uma brasilidade corrosiva, avessa ao nacionalismo acrítico que se tem espraiado pela ex-terra de “Santa cruz”.

 Neste livro estão todas essas marcas do poeta às quais acrescento o caráter memorialístico. Nele, Artur não apenas rememora antigos poemas por meio de alusões, paráfrases e paródias como traz para seus versos passagens assumidamente biográficas, se apropriando, em alguns momentos, do gênero diário.

 Estão contidos nessas memórias seus vários heterônimos: Gigi Mocidade, Federico Baudelaire, EuGênio Mallarmè, Federika Bezerra, Federika Lispector. Diferente do que ocorre com o poeta português Fernando Pessoa, a heteronímia em Artur não se manifesta menos na autoria do que no tecido ficcional. Suas diferentes personas emergem dos poemas para a realidade das redes sociais, interagem entre si, com o poeta e os leitores.

 É Gigi Mocidade, por exemplo, que carrega a bandeira do espírito subversivo com seu grito “Irreverência ou morte”, já nas primeiras páginas do livro, e a epígrafe de Federico Baudelaire “escrevo para não morrer antes da morte” anuncia a intenção memorialística. Sócrates, no seu diálogo com Fedro na obra de Platão, argumenta que a escrita seria a morte da memória, mas o que seria de todo o repertório literário não fosse essa invenção humana? Quais mentes suportariam tantos signos produtores de imagens cujos sentidos transcendem às vezes a razão? A escrita não se tornou a morte da memória, mas impossibilitou a morte dos poetas eternizados nas páginas dos livros e memórias dos leitores.

 

poema 10

meus caninos

já foram místicos

simbolistas

sócio políticos

sensuais eróticos

mordendo alguma história

agora estão famintos

cravados na memória

 

Nesses oito versos, o autor nos apresenta metalinguisticamente seu percurso poético até este livro que não é uma obra dedicada ao passado. O presente político do Brasil (des) norteia o poeta que não deixa de atacar com sua lira de peçonha os problemas que nunca deixaram de afligir estas paragens desde o suposto grito de Cabral.

 

poema 12

 

tem algo de errado

nessas estatísticas de mortes

dessa pandemia

multipliquem  60.000 X 10

e ainda não vai ser exato

o número de cadáveres

empilhados nos campos de concentração

que dá um nome ao   país

que ainda nem era uma nação

 

A verve surrealista do poeta se manifesta principalmente nos poemas narrativos protagonizados por personagens intertextuais como “macabea” (alusão evidente à conhecida protagonista de A hora da estrela de Clarice Lispector) e alter egos – lady gumes – parodísticos do próprio autor.

 

Em FULINAIMAGEM 14 o tom  de diário se instaura com inscrição de data do acontecimento rememorado e transborda na escrita de si em que se revela o papel que a poesia e o teatro desempenham na escritura de seu trajeto como autor: “a minha relação poesia teatro poesia é visceral vital para o que escrevo como quem encena  a necessidade do corpo como expressão”. Artur Gomes, este homem com a flor na boca, anda a espalhar o veneno agridoce de sua poesia, numa obra em que não há fronteiras entre o artista, o cidadão, o personagem, o eu poético, a obra. Seu livro não é um objeto, mas um produto interno e nada bruto. A obra é sempre muito maior que o livro, pois este, matéria assim como o homem, finda. A obra, esse totem que se pode cultuar no altar da memória, está sempre presente. E é disso que o poeta fala: do tempo presente, do homem presente, da vida presente. Parafraseando Drummond, com O Homem Com A Flor Na Boca, “não nos afastemos, não nos afastemos muito”, vamos de mãos dadas com a poesia de Artur.

 

Adriano Carlos Moura

Professor de Literatura – IFFluminense, Campos dos Goytacazes-RJ – Poeta, Ator, Dramaturgo


Os Tortes Tecem Considerações 

O ator, produtor, videomaker e agitador cultural Artur Gomes acumula uma bagagem de 50 anos de carreira com prêmios nacionais e internacionais em teatro, música, literatura e artes gráficas. Gomes poderia se filiar na tradição literária dos chamados poetas malditos, como comumente e simplistamente nos referimos àqueles autores que constroem uma obra “rebelde” em face do que é aceito pela sociedade, vista como meio alienante que aprisiona os indivíduos em normas e regras. Tais autores rejeitam explicitamente regras e cânones. Rejeição que se manifesta-se também, com a recusa em pertencer a qualquer ideologia instituída. A desobediência, enquanto conceito moral exemplificado no mito de Antígona é uma das características de tais sensibilidades poéticas, que no Brasil já vem de longe com um Gregório de Mattos e ganhou impulso e seguidores com o famoso trio da “parafernália” rebelde: Verlaine, Baudelaire e Rimbaud.

       Já tivemos oportunidade de observar em outras obras do autor, que suas construções poéticas seguem sempre renovadas para cima em matéria de criatividade, elencando uma variada diversidade temática que aborda, sempre em perspectiva ousada e radical, desde o doce e suave sentido do amor, ao cruel da relação amorosa, flertando com o libidinoso, e questões existenciais que expressam indignação, desobediência e transgressão. É que, explica ele: “arde em mim / um rio / de palavras / corpo lavas erupção / mar de fogo / vulcão”.  Outra faceta do autor, digna de nota, é a criação de vários heterônimos como sejam Federico Baudelaire, EuGênio Mallarmè ou Gigi Mocidade, talvez a mais irreverente de todos, porque fala a bandeiras despregadas, sem papas na língua. “Muitas vezes a língua pulsa pula para o outro lado do muro outras vezes a língua pira punk nesses tempos obscuros às vezes a língua Dada vai rolando dados nesse jogo duro muitas vezes a língua dark jorra luz nas trevas desse templo escuro”. 

E aqui temos afinal, mais uma obra desse múltiplo e incansável poeta que caminha com uma flor na boca, símbolo universal de amor, de paz e beleza. A ele não importa verdadeiramente por quais meios: “se sou torto não importa / em cada porta risco um ponto / pra revelar os meus destroços / no alfabeto do desterro / a carnadura dos meus ossos”. É poética que, para além de perquirir as dores e delícias da condição humana em si, envereda pelo viés de nossa condição social sempre ultrajada. Encontramos um poema que nos pergunta: “quem se alimenta / dessa dor / desse horror / desse holocausto // desse país em ruínas / da exploração dessas minas / defloração desse cabaço // quem avaliza o des(governo / simboliza esse fracasso?” Artur Gomes segue sua árdua caminhada, agora com o poderoso concurso da maturidade que lhe chega. Segue emprestando sua voz aos deserdados, aos desnutridos, aos que têm sede, aos que têm fome, ou aos que morrem assassinados nos guetos, nos campos, nas cidades por balas de fuzil, desse país que tarda em referendar a cidadania.

Krishnamurti Góes dos Anjos - Escritor e 

crítico literário.


o poeta resiste

ao que vem da pedra

fedra

artemanha – artéria aberta

no asfalto

onde chão não mais existe

 

Artur Gomes

O Poeta Enquanto Coisa

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Sistema Único De Poesia - SUP

com uma câmera nas mãos
um livro no chão
e um poema na cabeça
vamos filmar o poema
antes que desapareça

quem me vê assim
tão comportado
não sabe o que se passa
aqui no centro

não sabe
desse vulcão
em erupção
nesse serTão
do mato dentro

Itamarna é uma cidade morna quase cinza sem brilho mesmo assim pelas noites passeiam por ali vaga-lumes vagabundos com suas asas de lâmpadas lamparinas Irina também passeia por ali pelas madrugadas vestida de quase nada

inútil pensar Irina
vestida de serpentina
como fez Cinzia Farina
em seu poema visual
era uma tarde de chuva
num sonho de carnaval

impossível pensar Clarice em tudo ela me disse que detesta carnaval e assim só de pirraça quero ser seu mestre/sala pra mudar a sua fala e a lançar no temporal

come vento menina
come vento
não há mais metafísica no mundo
do que comer vento

Artur Gomes
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Teatro do Absurdo 8

a mulher  que come livros – cena 1

 

Federico - come vento menina come vento. não há mais metafísica no mundo do que comer vento

Clarice - prefiro chocolate

Federico - mas isso aí é um livro

Clarice - não faz mal, é como se fosse

Federico - como se fosse é muito vago

Clarice - pode ser vago pra você mas para mim não é

Federico - você é muito estranha

Clarice - estranha por quê?

Federico - parece até que come livros!

Clarice - e o quê você tem com isso? te incomoda?

Federico - calma, não precisar se irritar!

Clarice - mas quem disse que estou irritada?

Federico - do jeito que você fala!

Clarice - e você queria que eu falasse como?

Federico - normal

 

Clarice - mas eu falo normal como eu falo esse é o meu normal de falar.  Se não está gostando dá licença, e para de fazer perguntas.

Federico - grossa!

Clarice - não gosto de muitas perguntas. sou assim mesmo

Federico - mas não precisa xingar!

Clarice - e quem foi que xingou?

Federico - se não xingou foi quase

Clarice - me deixa em paz. que eu quero terminar de comer meu livro

Federico - é doida, comer seu livro?

Clarice - modo de dizer. já te disse sou assim mesmo

Federico - assim mesmo como?

Clarice - gosto de comer livros, romances, ficção, principalmente  poesia

Federico - quero dizer que ainda arde tua manhã em minha tarde

Clarice - nem vem que não tem

Federico - nem tem o quê?

Clarice - essa cantada barata

Federico - tua noite no meu dia

Clarice - vai insistir?

 

Federico  - tudo em nós que já foi feito com prazer ainda faria

Clarice - o que nós já fizemos? tá doido?

Federico - quero dizer que ainda é cedo ainda tenho um samba/enredo

Clarice - fique sabendo que prá mim é tarde

Federico - tudo em nós é carnaval é só vestir a fantasia

Clarice - detesto carnaval

Federico - quero ser teu mestre sala e você porta/bandeira. quando chegar a quarta-feira a gente inventa outra folia

Clarice - você quer fazer o favor de me deixar de comer meu livro

Federico - vai me dizer que não gostou?

Clarice - detestei.  cantada barata igual a essa eu já ouvi de um monte

Federico - duvido!

Clarice - então fica aí com a sua dúvida por quê quanto a isso eu não tenho nenhuma. e me dá licença que eu vou terminar de comer meu livro

(lendo o livro)

 

 Federico - come chocolate menina, come chocolate. não há mais meta física no mundo do que comer chocolate.



Sarau Cutural – As Multilinguagens

Ocupação Poética – no Palácio da Cultura

 27 outubro 19h

 

 

Clara Abreu : esquete: DANINHA

 

texto, direção e performance: CLARA ABREU

Clara Abreu : Uma em cada quatro mulheres que já viveram um relacionamento, sofreram violência exclusivamente dos parceiros.

 

Esse é o eixo norteador da Esquete Teatral, dando enfoque em sua característica conjugal e abordando fases do relacionamento abusivo. DANINHA, como é nomeada a cena, pretende informar e desenvolver reflexões a cerca deste problema social e, infelizmente, comum.

Clara Abreu, 25 anos, atriz

Início da prática aos 15, pelo Curso Livre de Teatro, atualmente Licencianda em Teatro pelo Instituto Federal Fluminense. Em parceria com a Santa Paciência Casa Criativa ofertou oficinas teatrais para crianças e adolescentes. Melhor Direção pelo trabalho autoral, DANINHA, na Semana da Arte na Universidade Cândido Mendes, indicação ao de Melhor Atriz pelo Festival SATED, em 2019, no Teatro de Bolso Procópio Ferreira, onde no mesmo estreou trabalhos, neste ano de 2023, como Anti Amor, A Última Festa, O Julgamento de Lúcifer e Conversas com Chocolate.



Sarau Cultural

As Multilinguagens no Palácio

27 outubro 19h – no Palácio da Cultura – Ocupação Poética

coordenação e produção

Artur Gomes 


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Realização: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima

 Terapia de Patrões

Esquete de Ique Frias

com Ique Frias, Pedro Gasparini, Samyla Jabor, Valdney Mendes, Priscila Pessanha e Flávia Tavares.

Utilizando um humor ácido, Terapia de Patrões denuncia o descaso aos direitos trabalhistas.


Juras Secretas 

feitiçarias de Artur Gomes - por Michèle Sato 

Difícil iniciar um prefácio para abordar feitiçarias de um grande mestre. A mágica aparição do texto transborda sentidos cósmicos, como se um feixe de luz penetrasse em um túnel escuro dando-lhe o sorver da vida. Diariamente, recebo um deserto imenso de poemas e a leitura se esvai com “batatinha quando nasce põe a mão no coração”. Um ou outro me chama a atenção, desde que sou do chamado “mundo das ciências” e leio poemas com coração, mas inevitavelmente aguçado pelo olhar crítico vindo do cérebro. 

A academia pode ser engessada, mas é, sobremaneira, exigente. Aplaude o inédito, reconhecendo que o poema é um caos antes de ser exteriorizado, mas harmônico, quando enfeitiçado. A leitura requer algo como canto do vento, que não seja fugaz, mas que acaricie no assopro da Terra. Por isso, é com satisfação que inicio este pequeno texto, sem nenhuma pretensão de esgotar o talento do grande mestre, mas responder aos poemas de Artur que brilham, soltam faíscas, incendeiam-se em erotismo e garras enigmáticas. Ele transcende regras, inventa palavras, enlouquece verbos. E as relações estabelecidas revelam a desordem dos sonhos na concretude harmônica de suas palavras. 

A aventura erótica não se despede de seu olhar político. Situado fenomenologicamente no mundo, e transverso nele, Artur profana o sagrado com suas invenções transgressoras. Reinventa a magia e decreta uma nova vida para que o mundo não seja habitado somente pelos imbecis. Dança no universo, com a palavra fluída, imprevistos pitorescos, mordidas e grunhidos. Reaparece no meio de um cacto espinhoso, mas é absurdamente capaz de ofertar a beleza da flor. Contemporâneo e primitivo se aliam, vencem os abismos como se ao comerem as palavras monótonas, pudessem renascer por meio da antropofagia infinita de barulhos e silêncios. O sangue coagulado jorra, as cavernas se dissolvem e é provável que poucos compreendam a beleza que daí se origina. 

Nos labirintos de suas palavras, resplandece o guerreiro devorador, embriagado, quase descendo ao seu próprio inferno. Emana seu fogo, na ardência de sexo e simultaneamente na carícia do amor. Pedras frias se aquecem, coram com o tom devasso que colore a mais bela das pornofonias. Marquês de Sade sente inveja por não ser o único déspota das palavras sensuais. E os poemas de Artur reflorescem, exalam odor como desejos secretos e risos que ecoam no infinito. 

não fosse essa alga queimando em tua coxa ou se fosse e já soubesse mar o nome do teu macho o amor em ti consumiria (jura secreta 5) 

De repente um cavalo selvagem cavalga na relva úmida, como se o orvalho da manhã pudesse revelar o fogo roubado das pinturas rupestres. Ao som de tambores, suas palavras se tornam arte em si, como se fossem desenhos projetados em um fantástico mundo vertiginoso. Seres encantados surgem das águas originários de sentimento, abraçadas nas pedras lisas, rugosas, esverdeadas da terra. O fogo dança em vulcões e a metamorfose é percebida em seus ares. Os elementos se definem como bestas, humanos, ou segmentos da natureza como uma orquestra sinfônica que vai além da sonoridade. Adentram sentidos polissêmicos e, neste momento, até o André Breton percebe o significado das palavras de Artur, pois a beleza é convulsiva e crava no peito feito cicatriz. 

e o que não soubesse do que foi escrito está cravado em nós como cicatriz no corte (jura secreta 10) 

Da violação do limite, do fruto proibido ou da linguagem erótica, os poemas de Artur são orgasmos literários que oscilam entre o sacro e o profano. Sua cultura, visão de mundo e inteligência possibilitam ir além da pura emoção sentimental, evocando a liberdade para que a terra asfixiada grite pela esperança. Artur comunga com outros seres a solidariedade da Terra, ainda que por vezes, seja devastador em denunciar disparidades, mas é habilidoso em anunciar acalentos. A palavra poética desfruta fronteiras, e Roland Barthes diria que a história de Artur é o seu tributo apaixonado que ele presta ao mundo para com ele se conciliar. Em sua linguagem explosiva, provavelmente está a intensidade de sua paixão - um amor perverso o suficiente para viciar em suas palavras, mas delicado o bastante para dar gênese ao mundo enfeitiçado pela habilidade de sua linguagem. 

A essência deste perfume parece estar refletida num espelho, pois se as linguagens podem incluir também o silêncio, as palavras de Artur soam como uma melodia. Projetada numa tela, a pintura erótica torna-se sublime e para além de escrevê-las, ele vive suas linguagens. Esta talvez seja a diferença de Artur com tantos outros poetas: a sua capacidade de transcender a tradição medíocre para viver um intenso de mistério de sua poética. Ele não duvida de suas palavras, nem as censura para não quebrar seu encanto, mas devora em seu ser na imaginação e no poder de sua criação. Criador e criatura se misturam, zombam da vida, gargalham da obviedade. Põem-se em movimento na dança estrelas que iluminam a palavra. 

Os fragmentos poéticos são misteriosos de propósito, uma cortina mal fechada assinala que o palco pode ser visto, porém não em sua totalidade. Disso resulta a sedução para que ele continue escrevendo, numa manifestação enigmática do poder surrealista em nos alertar sobre nossas incompletudes fenomenológicas. O imperfeito é o sentido da fascinação, diria Barthes em seus fragmentos de um discurso amoroso. E a poética de Artur não representa ressurreição, nem logro, senão nossos desejos. O prazer do texto pode revelar o prazer do autor, mas não necessariamente do leitor. Mas Artur lança-se nesta dialética do desejo, permitindo um jogo sensual que o espaço seja dado e que a oportunidade do prazer seja saciada como se fosse um "kama sutra poético" para além do prazer corporal. Esta duplicidade semiológica pode ser compreendida como subversiva da gramática engessada - o que, em realidade, torna seus textos mais brilhantes. Não pela destruição da erudição, mas pela abertura da fenda, para que a fruição da linguagem seja bandeira cultural da liberdade. 

E a sua liberdade projeta-se num horizonte onde a dimensão sócio-ambiental é freqüentemente presente. É uma poesia universal de representações urbanas e rurais, de flora, fauna e fontes de praças públicas. Desacralizando o “normal previsível”, borda em sua costura de mosaicos, esquinas e passaredos. 

eu sei de gente e de bichos ambos atolados no lixo tem gente que come bicho tem bicho que come gente tem gente que vive no lixo tem lixo que mora no bicho gente que sabe que é bicho e bicho que pensa ser gente (jura secreta 28) 

A poética das Juras Secretas opõem-se a instância pretérita numa espiral de presente com futuro. Metafisicamente, desliga-se do momento agonizante e os olhos do poeta não se cansam, ainda que a paisagem queira cansá-los. Seu toque lembra o neoconcretismo, por vezes, cuja aparição na semana da arte moderna mexeu com os mais tradicionais versos da literatura ordinária. Mas sua temporalidade vence Chronos, na denúncia de um calendário tirano ao anúncio de Kairós, também senhor do tempo, mas que media pelos ritmos do coração. 

20 horas 20 noites 20 anos 20 dias até quando esperaria... até quando alguém percebesse que mesmo matando o amor o amor não morreria. (jura secreta 51) 


É óbvio que a materialidade da linguagem, sua prosódia e seu léxico se mantêm no texto. Mas foge das estruturas engessadas do arrombo repetitivo, florescendo em neologismos verossímeis e ritmos cardíacos. Amiúde, são palavras jorradas em potente cultura significante. No chão dialogante, este poeta desestabiliza a normalidade com suas criações. 

por que te amo e amor não tem pele nome ou sobrenome não adianta chamar que ele não vem quando se quer porque tem seus próprios códigos e segredos mas não tenha medo pode sangrar pode doer e ferir fundo mas é razão de estar no mundo nem que seja por segundo por um beijo mesmo breve por que te amo no sol no sal no mar na neve. (jura secreta 34) 

ARTUR GOMES é, para mim, um grande relato de seu próprio devir, que sabe poetizar a partir de seu vivido. E por isso, enfeitiça. 

 

Michèle Sato – Bióloga, pesquisadora na Universaidade Federal do Mato Grosso do Sul. 

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Pedra Pássaro Poema

 

era uma vez um mangue

e por onde andará Macunaíma

na sua carne no seu sangue

na medula no seu osso

será que ainda existe algum

vestígio de Macunaíma

na veia do seu pescoço?

 

na teoria dos mistérios

dos impérios dos passados

nas covas dos cemitérios

desse brasil desossado?

 

Macunaíma não me engana

bebeu água do paraíba

nos porões  dos satanazes

está nos corpos incinerados

na usina de cambaíba

em campos dos Goytacazes

 

Macunaíma não me engana

está nas carcaças desovadas

na praia de manguinhos

em são francisco do itabapoana

 

Artur Gomes

O Homem Com A Flor Na Boca

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MOENDA

Usina mói a cana
o caldo e o bagaço

Usina mói o braço

a carne o osso

Usina

mói o sangue a fruta e o caroço
tritura suga torce
dos pés até o pescoço

e do alto da casa grande
os donos do engenho controlam
:

o saldo e o lucro

 Artur Gomes

Poema dos livros: Suor & Cio – 1985

Pátria A(r)mada  - Desconcertos Editora – 2019 – 2ª Edição 2022

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 Amanhece

 E, se nesta manhã que amanhece, se arrasta, espicha e espreguiça buscando romper com a escuridão, eu nada quisesse ou esperasse?

 Como os galos, nenhuma preocupação, nenhum anseio. O poço infindo das expectativas zerado, esvaziado.

 Se eu não esperasse por nada, nada a querer: nem pelo comportamento das bolsas, das massas, pelo movimento dos políticos, dos algozes, dos bandidos, traficantes, milicianos ou religiosos que nos governam;  pelo fim de alguma guerra que engendra a próxima, já que guerra é a única possibilidade e os galos nem se manifestam ou se abalam com ela.

 Nenhum boleto a vencer, nenhuma mensagem a chegar, apenas o ambiente fértil, propício à poesia: o imenso vazio e o improvável silêncio, o canto do Sabiá.

 E se, apenas assim, sem nada esperar, liberasse Deus de qualquer compromisso comigo: nenhuma promessa, nenhuma vitória, nenhum porvir. Porque amanhece e isto já basta e, enfim, eu deixasse Deus descansar?

 Ah, se essa manhã que se arrasta e demora, pelo empurrão do cocoricó insistente, se fizesse completamente manhã, e eu nada esperasse.

 

Alexandro 


Sarau Campos VeraCidade

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