os loucos e os
sãos
os profetas e os pagãos
nós e eles
os jovens e os anciãos
morreremos
todos
de amor
de dor
de fome ou nutridos
com ou sem dinheiro
por doença
ou desespero
morreremos
por indiferença
imprudência
ou experiência
mesmo com os avanços
da ciência
não há manto que proteja
da sentença derradeira
em alguma semana
no sábado
ou na segunda-feira
morreremos
a vida é para ser morrida
a cada dia
não há
remédio que anule
os dias morridos
nos brindes do bar
ou fator que proteja
os efeitos na pele
do bronze
no banho de mar
não há reza
que impeça
o corpo (de)formar
outro corpo virá
com ou sem cirurgia
cremes e as demais liturgias
não há
talvez você acredite
na centelha divina
na carne que padece
e fenece
por castigo
mesmo com prece
no limite do corpo
mas na alma
que prevalece
ainda assim
morreremos
aqui
onde tudo acontece
o beijo que apetece
o sexo que oferece
o trabalho que aborrece
a solidão que emudece
o dia que amanhece
e a noite que esquece
morreremos
aqui
onde a casa foi construída
os filhos foram criados
a lágrima foi acolhida
e os abraços apertados
morreremos
ou talvez
você seja um daqueles
que crê no fim
simplesmente
no pó que alimentará
a terra quente
pra brotar nova semente
indubitavelmente
quem diz
que a vida é para ser vivida
mente
e cria essa agonia
de ser feliz
a qualquer custo
todo dia
uma ilusão produzida
pra vender uma saída
incoerente
ao medo de morrer
vivemos
brutalmente
excludentes
e indiferentes
às vidas morridas
cotidianamente
Flávia Gomes
Foto tirada por mim, na Floresta da Tijuca,
Quando
Quando o meu corpo apodrecer e eu for morta
Continuará o jardim, o céu e o mar,
E como hoje igualmente hão-de bailar
As quatro estações à minha porta.
Outros em Abril passarão no pomar
Em que eu tantas vezes passei,
Haverá longos poentes sobre o mar,
Outros amarão as coisas que eu amei.
Será o mesmo brilho, a mesma festa,
Será o mesmo jardim à minha porta,
E os cabelos doirados da floresta,
Como se eu não estivesse morta.
Sophia de Mello Breyner Andresen
In “Dia do Mar”
tentáculo
aqui
virei quartel do passado
como um flerte a tudo que angustia e anima sem
entretela
sou como visto ao longe como nunca se viu
nenhum binóculo com sua exatidão consegue alcançar
os meus passos
mesmo a noite nessa dimensão surreal
meu espirito e seus ladrilhos
são como cães afoitos
tentando conter a fome do mundo e a cor que
atravessa os seus dias como nunca se viu entre nós
só me resta chorar muito
como um carretel sem fim
por sobre a árvore que me viu nascer até ir embora
dessa esfera exatamente como um alçapão no morro por onde os pássaros
confabulam bíblias sem olhos e refratárias paisagens de mim e dos outros portos
pedintes do muito que anoitece e flora.
Carlos Gurgel
éramos assim
anjos quase
mas nem tanto
me dizia
EuGênio Mallarmè
as Flore do Be-Me-Quer
podem ser Mal
me dizia Baudelaire
Federika
Lispector
https://fulinaimicamente.blogspot.com/
se eu soubesse
diria teu nome
essa fome
sangrando janeiros
tuas pernas abertas
ao medo
....................................................
o estômago sempre vazio
é um órgão criativo
esqueça a escassez
alimente incêndios
de poetas
o inferno está cheio
....................................................
os pássaros sabem
o salto contém a queda
para voar
é preciso
cortar asas
.......................................................
se eu soubesse
um verso faria
teus olhos fechados
para reforma
as garrafas não falam
sozinhas
.........................................................
um léxico
de silêncios
para melhor
ouvir
os pelos
crescendo
.........................................................
ela sabe
o que eu não sei
enfiar a língua
até o fundo
do meu ouvido
exterminar a paz
dos domingos
estar ausente
apenas
sendo
garbo gomes
21.01.23
Ilustração :
Cidade submersa
Óleo sem tela
( 42 × 30 )
Ivo Machado
— em União da Vitória
MANTO DE FLORES
.
Quando eu morrer, não quero flores sobre o meu
caixão.
As flores devem enfeitar a vida e não a morte.
Não matem as flores, arrancando-as do chão.
Não as culpem pelo meu azar ou pela minha sorte.
.
Deixem-nas vivas, perfumando e espalhando o seu
encanto,
colorindo os campos e as cidades, do Sul ao Norte.
Quando eu morrer, não quero flores mortas como
manto:
por que tirar a vida delas pra celebrar a minha
morte?
.
Quando eu partir, não me cubram com flores.
Que ninguém as arranque na minha despedida,
ceifando o seu perfume e apagando as suas cores.
.
Não há motivos pra que chorem na minha partida.
Amei, fui amado e tive mais prazeres do que dores.
Vivam felizes, que serei feliz nos jardins da
outra vida.
.
Remisson Aniceto
Soy letras...
Un suspiro...
Ese poema que se desangra
entre la madrugada
y el insomnio que me atormenta.
Soy esa canción
que en la radio suena.
Así,
de pronto,
cuando sin querer,
mi soledad te piensa.
Soy quien te anhela...
quien te escribe....
quien va esparciendo latidos
de un corazón en tu espera...
Soy
quien jamás dejará de sentirte,
de amarte,
sabiendo que no llegas...
Quien se abraza a tu sombra,
se duerme en tu recuerdo
e inmola su mañana
sacrificádose en tu ausencia.
Lau
Laura
Defilippi
BS.AS.Argentina
04
Poemas/Tankas do livro (INÉDITO) "Lua Perfumada – Foices de Gazzah",
***
verão em tormenta.
a criança assiste a pandorga
cair como pedra.
luzes imprimem às rochas
uma explosão de crisântemos.
*
à luz da lua
conta histórias sobre o amor
a mãe palestina.
ruído do choro da corça
e o vento através das tâmaras.
*
seu rosto era angelical
porém os olhos – imóveis.
tâmaras e crianças
no lodo – o céu turvando
à sombra de obuses.
*
ventos cortantes.
lentamente, lentamente
criança inala o ar.
sob seus pés flutuam pássaros
e o mundo inteiro se cala.
*
imagem: "Keffiyeh", by Ziul Serip.
Te busqué en otras letras,
otra boca,
otros versos..
Te busqué en otros labios,
otra piel,
otro cuerpo...
Te busqué en otra luna,
otro suspiro,
otro sueño...
Y me fue imposible amarlo
cuando sus manos me recorrieron...
se me hizo escarcha sentirlo,
se me hizo hielo tenerlo...
Recogí mis ropas del piso...
Y me marché,
con el fantasma de tu recuerdo.
Lau
Laura Defilippi
BS.AS.Argentina
Espero a tua vinda
a tua vinda,
em dia de lua cheia.
Debruço-me sobre a noite
a ver a lua a crescer, a crescer...
Espero o momento da chegada
com os cansaços e os ardores de todas as
chegadas...
Espero a tua vinda
a tua vinda,
em dia de lua cheia.
Debruço-me sobre a noite
a ver a lua a crescer, a crescer...
Espero o momento da chegada
com os cansaços e os ardores de todas as
chegadas...
Fernando Namora
PARTIU-SE O SOL
Partiu-se o Sol
entre nuvens de cobre.
Dos montes azuis chega um ar suave.
No prado do céu,
entre flores de estrelas,
vai a Lua em crescente
como um gancho de ouro.
Pelo campo, (que espera os tropéis de almas),
vou carregado de tristeza.
Pelo caminho só.
Porém o meu coração
um raro sonho canta
duma paixão oculta
em lonjura sem fundo.
Ecos de mãos brancas
sobre a minha fronte fria,
paixão que maturasse
com o choro dos meus olhos!
* Tradução de Tomás
Sottomayor.
* * *
PARTIU-SE O SOL
Partiu-se o sol
entre nuvens de cobre.
Dos montes azuis chega um ar sonoro.
No prado do céu,
entre flores de estrelas,
a lua vai em crescente
como um garfo de ouro.
Pelo campo (que espera os tropéis de almas),
vou carregado de pena,
pelo caminho só;
porém o meu coração
um raro sonho canta
de uma paixão oculta
a distância sem fundo.
Ecos de mãos brancas
sobre a minha fronte fria,
paixão que se madurou
com pranto de meus olhos!
LORCA, Federico García. "Se ha quebrado el
sol" / "Partiu-se o sol". In:_____. "Poemas esparsos".
In:_____. Obra poética completa. Tradução de William Agel de Melo. Brasília:
Editora U. de Brasília. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
SE HA QUEBRADO EL SOL
Se ha quebrado el sol
entre nubes de cobre.
De los montes azules llega un aire suave.
En el prado del cielo,
entre flores de estrellas,
va la luna en creciente
como un garfio de oro.
Por el campo (que espera los tropeles de almas),
voy cargado de pena,
Por el camino solo;
Pero el corazón mío
un raro sueño canta
de una pasión oculta
a distancia sin fondo.
Ecos de manos blancas
sobre mi frente fría
¡pasión que maduróse
con llanto de mis ojos!
Federico Garcia
Lorca
Menino do
Bairro Negro
"Olha o sol
que vai nascendo
Anda ver o mar
Os meninos vão correndo
Ver o sol chegar
Menino sem condição
Irmão de todos os nus
Tira os olhos do chão
Vem ver a luz
Menino do mal trajar
Um novo dia lá vem
Só quem souber cantar
Vira também
Negro, bairro negro
Bairro negro
Onde não há pão
Não há sossego
Menino pobre, o teu lar
Queira ou não queira o papão
Há de um dia cantar
Esta canção
Olha o sol que vai nascendo
Anda ver o mar
Os meninos vão correndo
Ver o sol chegar
Se até dá gosto cantar
Se toda a terra sorri
Quem te não há de amar
Menino, a ti
Se não é fúria, a razão
Se toda a gente quiser
Um dia hás de aprender
Haja o que houver
Negro, bairro negro
Bairro negro
Onde não há pão
Não há sossego
Menino pobre, o teu lar
Queira ou não queira o papão
Há de um dia cantar
Esta canção."
José Afonso
Diálogo
E se eu morresse em um dia de sol?
Tudo tão azul.
Nada na cabeça.
Eu me deixando ir
No caminho suave
Das nuvens brancas.
(Sensação de partida
Um último olhar sobre as flores)
Seria um dia feliz.
Um dia de sol.
Repleto de sons e risos.
Faria da morte um acontecimento diferente
Nada de choro ou céu nublado,
Só a tranquilidade de mais uma tarde.
O cheiro do café.
As brincadeiras das crianças
As frutas cheirando no quintal.
Um belo dia de sol.
E, a morte seria branda.
Sem temporais ou premonições.
Só o silêncio do imóvel coração.
Que repousa frio,
Em alguma beira de riacho
No torpor da tarde quente.
Ádila Cabral.
Frémito
*
Frémito do meu corpo a procurar-te,
Febre das minhas mãos na tua pele
Que cheira a âmbar, a baunilha e a mel,
Doido anseio dos meus braços a abraçar-te,
Olhos buscando os teus olhos por toda a parte,
Sede de beijos, amargor de fel,
Estonteante fome, áspera e cruel,
Que nada existe que a mitigue e a farte!
E vejo-te tão longe! Sinto a tua alma
Junto da minha, uma lagoa calma,
A dizer-me, a cantar que me não amas …
E o meu coração que tu não sentes,
Vai boiando ao acaso das correntes,
Esquife negro sobre um mar de chamas …
RUY GUERRA - Arte e Revolução (CINEMA, CRÍTICA, 2019)
Adilson Mendes org.
“Ruy Guerra: arte e revolução” é a reunião de diferentes olhares sobre o trabalho do cineasta nas décadas de 1960 e 1970. Reflexões do próprio artista comparecem ao lado de escritos de época e análises recentes produzidas no campo universitário.
Rogério Sganzerla, Roberto Schwarz,
Glauber Rocha, Alex Viany, Jean-Claude Bernardet, Paulo Emílio Sales Gomes,
Jairo Ferreira e outros debatem a obra de Guerra em ensaios, críticas de jornal
e acadêmicas, anotações e entrevistas.
O livro se concentra nos primeiros
filmes do cineasta concluídos no Brasil: “Os cafajestes” (1962), “Os fuzis”
(1963), “Os deuses e os mortos” (1970) e “A queda” (1976), co-dirigido com
Nelson Xavier.
Organização pelo historiador Adilson
Mendes.
ADILSON MENDES é historiador pela Universidade
Estadual Paulista (Unesp), com mestrado e doutorado pela Escola de Comunicação
e Artes da Universidade de São Paulo. Autor de “Trajetória de Paulo Emílio”
(Ateliê, 2013), desenvolve pesquisa
de pós-doutorado junto ao Programa de
Pós-graduação de Comunicação na Universidade Anhembi Morumbi.
Capa Brochura - formato 14x21 cm - páginas 312
Claudinei Vieira – Desconcertos Editora
Esperança
"Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso voo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na
calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não
esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA..."
Mario Quintana
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