segunda-feira, 6 de março de 2023

Mirian Carvalho

 

I

Tal aquele barqueiro distraído
que perdeu a isca e fisgou o remo as pescar
a lua, eu queria escrever distraidamente.
E encurvar o anzol até fechar-se um círculo
para que minhas palavras não caiam.

Quando engulo abstrações, morro de tédio.
Por isso, para sobreviver, meu devaneio
desce ao chão e distende-se numa caminhada.
E ao pisar na relva meus passos
estalam folhas secas.

Mas não é por maldade que piso
nas coisas da terra. A elas meus sapatos
irmanam-se no ímpeto que as faz
viver na simplicidade do cotidiano
a engendrar bichos de nuvem.

E distraidamente mantemos
o fôlego.

Mirian de Carvalho


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